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Cirurgia Ambulatorial somente para baixa complexidade? Está na hora de rever seus conceitos.

Article-Cirurgia Ambulatorial somente para baixa complexidade? Está na hora de rever seus conceitos.

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O termo “cirurgia ambulatorial”, por muitas vezes, acaba sendo confundido com casos de pequeno porte, atendimentos de enfermaria ou intervenções menores, realizadas em salas de procedimento, dentro de clínicas médicas. 

Para além das situações descritas acima, o conceito de cirurgia ambulatorial refere-se aos procedimentos cirúrgicos, realizados em um ambiente hospitalar completo, com estrutura, equipe e tecnologia. Eles são dedicados a procedimentos dos mais variados tipos, especialidades e complexidades, promovendo a admissão e a alta do paciente no mesmo dia, sem que haja a necessidade de mantê-lo internado, por um ou mais dias, após a cirurgia.

Os centros cirúrgicos ambulatoriais podem realizar com segurança e eficácia uma ampla gama de procedimentos cirúrgicos. Este tipo de unidade dispõe de equipes treinadas, equipamentos e infraestrutura para lidar com casos complexos. Adicionalmente, estão sujeitos aos mesmos padrões regulatórios, de qualidade e segurança dos hospitais gerais.

Imagem: cortesia do Hospital Esselense.sala cirurgica.jpg

Sala cirúrgica ambulatorial, com estrutura e tecnologia nos mesmos padrões de hospitais gerais.

Unidade Cirúrgica Ambulatorial tem UTI?

Esta é uma das perguntas mais frequentes realizadas por pacientes, familiares e alguns médicos, pouco habituados com o modelo de cirurgia ambulatorial. A resposta para esta pergunta passa pelas características de seleção do paciente, que é atendido em uma unidade cirúrgica ambulatorial, e o perfil assistencial deste tipo de unidade.

O conceito de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), como se entende no senso comum, como uma ala do hospital, dedicada a cuidar de pacientes críticos e que necessitam de, como o próprio nome já diz, terapia intensiva, não existe dentro de um centro cirúrgico ambulatorial. Isso porque essa unidade foi criada para atender exatamente o tipo de paciente que não irá precisar de terapia intensiva após sua cirurgia, mesmo com algum grau de complexidade, e poderá se recuperar no conforto de sua casa.

É seguro realizar um procedimento cirúrgico em uma unidade ambulatorial, sem UTI? E se houver alguma complicação?

Segundo o Dr. Fábio Alves Soares, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial, todo centro cirúrgico ambulatorial é submetido às mesmas regras e fiscalizações que um hospital geral. Todos são obrigados a ter estrutura de emergência e cuidados intensivos ao paciente, na eventualidade e improvável chance de uma intercorrência. Isto significa que toda unidade cirúrgica ambulatorial possui a estrutura de atendimento necessária para gerenciar complicações, da mesma maneira que seria feito em um hospital geral. Porém, como isso não é comum em unidades ambulatoriais, não faz sentido manter alas e leitos de UTI. 

Além disto, todo centro cirúrgico ambulatorial é obrigado a ter uma estrutura própria ou terceirizada de UTI móvel (ambulância com recursos avançados) e hospital geral de retaguarda. Essa estrutura é acionada se houver necessidade de remover algum paciente da unidade para permanecer internado em um hospital geral. Isso é raro de acontecer e só ocorre após todos os cuidados iniciais, em um evento adverso, terem sido prestados, dentro da unidade ambulatorial, e o paciente encontrar-se estabilizado, para então poder ser transferido e continuar internado, em um hospital geral, para sua recuperação.

Sendo assim, ao colocarmos as perguntas de uma forma diferente, fica mais fácil de entender: Unidades cirúrgicas ambulatoriais possuem UTI? A resposta curta é: Não. Unidades cirúrgicas ambulatoriais possuem os mesmos equipamentos, médicos, enfermeiros e capacidades emergenciais, que existem em uma UTI? A resposta curta é: Sim.

Uma evolução de mais de 200 anos  

A história da cirurgia ambulatorial remonta ao início de 1800, quando Robert Campbell, um cirurgião escocês, foi pioneiro e realizou em 1817 a primeira tonsilectomia ambulatorial descrita. Este procedimento inovador abriu caminho para que outros cirurgiões despertassem seu interesse no desenvolvimento e aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas ambulatoriais. Em 1848, outro importante nome da cirurgia ambulatorial, James Nicoll, realizou a primeira operação de hérnia ambulatorial e reportou em 1909 a realização de 8.988 cirurgias em crianças, utilizando somente o regime ambulatorial.

Atualmente, mais de dois séculos após os primórdios da cirurgia ambulatorial, contamos com uma enorme quantidade de procedimentos cirúrgicos que podem, graças aos avanços da anestesia, tecnologia e técnicas cirúrgicas, ser realizados em regime ambulatorial.

Sendo assim, podemos concluir que o perfil de seleção do paciente, suas condições gerais, avaliação da enfermagem, consulta pré-anestésica, cardiológica e da equipe cirúrgica, serão fatores preponderantes para a realização, ou não, de seu procedimento, em uma unidade cirúrgica ambulatorial.


Fabricio Galvão é membro fundador, diretor de mercado e presidente eleito para gestão 2024 a 2026 da Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial (SOBRACAM), delegado brasileiro da International Association for Ambulatory Surgery (IAAS), empresário e investidor na área da saúde.

Notas do autor:

  1. As questões regulatórias no Brasil criam uma área de indefinição sobre o tema e seu principal documento norteador, a RDC 50 de 21 de fevereiro de 2002 e do Cadastro Nacional de Estabelecimentos em Saúde (CNES), enquanto inexiste uma regulamentação específica para unidades cirúrgicas ambulatoriais multiespecialidades, enquadradas no conceito da IAAS, (International Association for Ambulatory Surgery), e da SOBRACAM, (Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial), com regras claras e bem definidas, como as que existem em outros países.
  2. Em diversos casos, as unidades ambulatoriais completas, que possuem a estrutura mencionada no artigo e atendem os conceitos de unidade cirúrgica ambulatorial preconizados pela IAAS (International Association for Ambulatory Surgery) e SOBRACAM (Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial), pautam-se pela regulação de hospital geral, que por ser mais ampla, abarca, do ponto de vista regulatório, com maior segurança assistencial e jurídica, o escopo de atividades tema deste artigo.
  3. Questões administrativas também interferem no enquadramento de uma unidade cirúrgica ambulatorial, sendo que para estar apta (legal e administrativamente) a realizar alguns tipos de procedimentos, e receber por isto, esta unidade deve se enquadrar como hospital geral ou de especialidades, mesmo não sendo. Há casos em que a contratualização com operadoras de saúde só se torna possível, após a mudança do CNES para Hospital Geral, devido a atual zona cinzenta que existe sobre o tema, do ponto de vista regulatório e administrativo.
  4. A SOBRACAM tem como missão ajudar no desenvolvimento de uma regulamentação clara e difusão do conceito de cirurgia ambulatorial, a fim de fomentar este importante ecossistema de saúde e mitigar as lacunas existentes na legislação atual.