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Open Health e a construção do Sistema de Saúde Digital no Brasil

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Por Lincoln Moura, diretor de Consultoria da área de Saúde da Accenture

Não é um assunto absolutamente novo, mas ainda exige reflexão por ser típico. Imagine, o paciente que, numa situação de emergência, foi parar no PS. Lá, ele precisa contar sua história de saúde, passar seus dados pessoais, exibir a carteira do seu plano de saúde, contar dos últimos exames, alergias, medicamentos em uso, entre outras informações. Fornecer dados frequentemente já disponíveis, é um problema que ele tem de lidar quando menos gostaria, e às vezes é impossibilitado de fazê-lo.

Pense no Open Health como um conceito similar ao de Open Banking, no qual — por meio do compartilhamento de dados — usuários dos serviços bancários podem disponibilizar suas informações financeiras e bancárias, voluntariamente, em favor de benefícios para si mesmos. Ao optar pelo Open Banking, o usuário e o mercado também têm mais flexibilidade, agilidade, redução de custos e eficiência como um todo. Aplicando esta visão no segmento de saúde, a Open Health promove as mesmas vantagens para pacientes ou beneficiários dos sistemas privados, ao prover melhores mecanismos de escolha, portabilidade e competição entre os planos de saúde.

A noção de “Ambientes Abertos” tem como grande princípio o entendimento de que dados e informações não apenas geram conhecimento, como são, em geral, o motor dos serviços oferecidos.

No setor bancário, o entendimento é óbvio: a informação autenticada por senha, a partir de um telefone móvel, gera as transações essenciais para o sistema bancário sem operador humano, à exceção do próprio usuário, correntista, que trabalha para o banco e para si mesmo. Os sistemas de pagamento são muito avançados, com destaque positivo para o brasileiro, e, em geral levam a uma relação ganha-ganha entre todos os atores. Assim, faz muito sentido utilizar dados e informações para oferecer a cada indivíduo mais controle sobre seu dinheiro e mais flexibilidade e agilidade ao escolher os serviços e produtos que deseja adquirir. Daí a oportunidade do conceito de Open Banking.

Obviamente, é muito relevante que os benefícios destes sistemas estejam disponíveis também para o setor da Saúde. Então, quais são os passos a serem tomados para avançarmos também no universo de Open Health?

Claro, há a necessidade de consentimento de acesso aos dados individualizados quaisquer que sejam, mas principalmente os de saúde –, o que é um princípio ético fundamental a ser observado. Contudo, apesar de complexo, este ainda não é o maior obstáculo ao compartilhamento de informações, uma vez que indivíduos e pacientes têm, de forma crescente, concordado com a utilização de seus dados (inclusive os de saúde) quando compreendem os benefícios e os riscos associados ao consentimento.

O obstáculo mais evidente para que se possa considerar Ambientes Abertos em Saúde é a fragmentação dos dados e dos processos associados, que ocorre em todos os níveis de organizações públicas e privadas. Frequentemente, nos deparamos com situações em que a mesma informação nos é solicitada diversas vezes, em um mesmo atendimento dentro de um único centro de saúde. Quando se trata de organizações de saúde distintas, a fragmentação é ainda maior. Solicitações de exames não estão eletronicamente disponíveis no laboratório de nossa preferência e a prescrição de medicamentos não chega na farmácia de nossa vizinhança. É esse paciente que abre o texto: ele chega no PS e precisa “contar tudo de novo”. Ao mudar de plano de saúde, por exemplo, devemos esperar que todos os nossos dados sejam ignorados pelo novo plano.

Até aqui, pode-se acreditar que bastaria, então, garantir que – se o paciente consentir – os seus dados em uma organização de saúde sejam enviados para a outra, abrindo-se, assim, as portas para a Open Health... Na verdade, grandes organizações, como Google, Apple, Microsoft e Amazon precisaram dispender energia, tempo e dinheiro em iniciativas depois descontinuadas para aprender que esta não é a realidade para o setor de saúde.

Ao contrário do sistema de pagamentos brasileiro, ou da sua mais nova geração (o PIX), não existem padrões robustos e universalmente aceitos que permitam a troca eletrônica de informação nas áreas mais relevantes da saúde.

A Saúde Suplementar utiliza um conjunto de terminologias e modelos de trocas de informações que atende às necessidades de faturamento entre prestadores de serviços (hospitais, clínicas e centros de diagnóstico, por exemplo) e planos de saúde. Da mesma forma, o setor público possui padrões voltados para medidas de produção de serviços e faturamento. Estes conjuntos de dados são relevantes e têm possibilitado avanços na produtividade dos serviços de saúde, mas são insuficientes para permitir o tratamento e o acompanhamento adequado da saúde das populações atendidas, nos setores público e privado, tanto do ponto de vista individual quanto populacional.

A Saúde Digital é um tema complexo e, obviamente, essencial para que se construam caminhos para os sistemas abertos de saúde.

Diversos países em todo o mundo têm procurado desenvolver as suas Estratégias de Saúde Digital, que declaram uma visão de longo prazo que, por sua vez, estabelece o que se deve esperar da Saúde Digital. Elas contam, ainda, com um Plano de Ação para viabilizar a visão proposta.

Ainda que essas ações envolvam tecnologia, há a clara necessidade de que se definam ações prioritárias para endereçar as necessidades de governança, liderança, financiamento, ética, legislação, regulação, conformidade, aderência às necessidades de saúde e de recursos humanos, componentes fundamentais da Saúde Digital. Recentemente, a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou a sua Estratégia Global de Saúde Digital, na qual estimula os países, empresas, centros de pesquisa e sociedade civil a desenvolverem estratégias nacionais e colaborarem entre si para que a Saúde Digital seja um instrumento verdadeiro de melhoria da saúde das nossas populações, sob controle ético, moral e financeiro da sociedade.

Em janeiro de 2021, o Ministério da Saúde publicou a Estratégia de Saúde Digital para o Brasil 2028, um documento elaborado com a participação de diversos setores e especialistas. A ESD28, como foi intitulado o documento, foi aprovada por todas as instâncias do Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive o Conselho Nacional de Saúde, e é uma iniciativa de estado, com foco em 2028.

A visão proposta na ESD28 é a de que “Até 2028, a Rede Nacional de Dados de Saúde (RNDS) estará estabelecida e reconhecida como a plataforma digital de inovação, informação e serviços de saúde para todo o Brasil, em benefício de usuários, cidadãos, pacientes, comunidades, gestores, profissionais e organizações de saúde.”

A RNDS já unifica, hoje, a carteira de vacinação de Covid de mais de 140 milhões de brasileiros, além de exames, procedimentos e outros serviços que tenham sido oferecidos pelo SUS. O aplicativo Conecte SUS é a porta de acesso de pacientes, cidadãos e profissionais de saúde aos dados da RNDS.

A Estratégia de Saúde Digital para o Brasil propõe, ainda, um Plano de Ação, orientado para atender sete prioridades nacionais, a ser desenvolvido sob a liderança do Ministério da Saúde e de forma colaborativa com os setores público e privado.

A ESD28 é um documento robusto, resultado de uma década de discussões sobre e-Saúde e Saúde Digital. Ele merece ser lido e estudado por todos que acreditam que a informação seja insumo fundamental para a Saúde.

Assim, o ministro da Saúde, que tem se mostrado um apoiador da Open Health, poderá prestar uma grande contribuição para o desenvolvimento da Saúde Digital se utilizar a Estratégia de Saúde Digital como instrumento de desenvolvimento das oportunidades de Open Health no Brasil.